Laos - Luang Prabang 16 de Dezembro de 2013
Hoje é dia de explorar cantos e recantos desta cidade Património da Humanidade segundo os padrões da Unesco. Surpreende-me o número de guest houses no centro histórico. Diria que há ruas inteiras onde apenas encontramos casas de hóspedes desta natureza. Das que visitámos, achei que eram melhores que as da Tailândia e aquela que escolhemos para estes três dias é uma gracinha. Toda em madeira, dividida em dois pisos. É assim como um chalet de montanha, mas num país tropical.
Notas para memória futura duma viagem inesquecível
Ao embrenharmo-nos na cidade através das suas múltiplas ruas e ruelas, vamos dar ao casco antigo. Aqui predominam os monges e inevitavelmente a vida monástica, com os seus templos, escolas, oficinas e alojamento para estes seres que escolheram como modo de vida, a incessante busca da pureza através da meditação.
Se na Ásia as pessoas, ruas e cidades são ruidosas, estes espaço de onde escrevo, são oásis de silêncio e contemplação. Sinto-me bem aqui! Na verdade até parece que me esqueci de quem sou. Absorvo de cada momento aquilo que este tem para me dar. Tenho uma espécie de esponja no olhar.
Regressámos ao mercado para começar o dia. Em cada dia um novo espetáculo de cor e de surpresa. Os produtos são comercializados segundo as regras locais, o que, para muitos ocidentais pode parecer chocante segundo os nossos castradores padrões.
Come-se em todo lado e a toda a hora, neste caso no mercado noturno
São 12.30 horas, parámos para almoçar numa zona calma da cidade.
Numa esquina que vendia sopas decidimos parar para almoçar. Cheiram bem as sopas que as duas orientais, nossas companheiras de mesa comem.
Quando as nossas chegaram, procurei imitar as raparigas locais, e introduzi na sopa aquilo que lhes vira juntar, mas em proporções que denunciavam precauções pela minha parte, não fosse o diabo tecê-las!
Como a fome era substancial, meti logo uma colherada à boca.
Quando as papilas gustativas detetaram os paladares gerou-se dentro de mim um invulgar turbilhão, entrando de imediato em alerta vermelho. A minha boca deixou de o ser. Passou a ser o Vesúvio em dia de erupção, tal era o fogo que me invadia e que subia das entranhas até aos lábios que por esta altura já deixara de sentir. Olhei para quem estava ao meu redor. Tudo normal. Só que os meus olhos insistiam em sair das órbitas. Fiquei mesmo com receio de um deles, ou quiçá os dois, me caírem na sopa.
A Natália vendo-me no olhar o pavor que me assistia, resolveu provar com cuidado a minha sopa.
— Fónix!— Exclamou ao mesmo tempo que bebia de um só golpe o copo de água à sua frente.
A nossa companhia ocasional, não foi capaz de conter o riso e desmancharam-se de gozo ao ver a aflição estampada nos nossos rostos.
Já depois do Etna me ter passado pela boca
Depois da experiência gastronómica relatada, passamos parte da tarde a deambular pelos recantos mais recônditos desta cidade milenar. Ao entardecer regressámos ao centro histórico onde decorria o mercado noturno e onde fizemos algumas compras natalícias.
Mercado noturno de Luang Prabang
As famosas gargantilhas de prata que eram (ou será que ainda são?) dotes de casamento.
Uma recordação gratuita - o sorriso genuino desta senhora
Esta feira desenvolve-se ao longo da rua principal, mesmo em frente ao principal templo e museu da cidade, tendo a particularidade de se realizar todos os dias do ano, quer chova ou faça sol. O artesanato da região é, como já disse, raro, fora do comum, bem feito e barato, daí os turistas de passagem por esta cidade confluírem para este espaço em busca da lembrança desejada.
Sempre os monges a povoar a paisagem
Num momento em regressámos à casa de hóspedes para depositar as mercas e descansar uns minutos, começamos a ouvir o som grave e seco de um gongo que invadia a cidade. Logo outro de outra tonalidade sonora mais distante se lhe seguiu, lá dos confins ainda outros se lhe juntaram, deixando no ar uma certa sonoridade bíblica, solene, a anunciar algo de importante que estaria para acontecer. A Natália precipitou-se para a rua, disposta a esclarecer o mistério dos gongos. Eu, preferi ficar ali, em silêncio, experimentando a sensação de quem está em todo o lado e em lado nenhum, no lugar certo e à hora certa.
O segredo da sonoridade bíblica
Quando regressou, a Natália trazia a explicação para tão cadenciada sinfonia de gongos. Hoje é noite de lua cheia, coincidente ainda com outros azimutes não decifrados no calendário das coisas da alma. Quando se conjugam todos estes elementos, todos os monges noviços têm de rapar do corpo todos os pêlos, mesmo os das sobrancelhas.
Lá pelas quatro da manhã, em plena calada da noite, voltaram a ressoar os gongos. Não tantos como à tarde nem por um período tão prolongado, mas mesmo assim uma toada envolvente dando a pressentir que algo estava a acontecer.
Voltei-me para a Natália e readormeci no calor do corpo dela e no zoar dos gongos dos monges de Luang Prabang que povoavam esse território chamado; distância!
Bem que a vida podia ser sempre assim! — Dou comigo a pensar antes de me render aos braços de Morfeu.
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