Trekking na Selva Tailandesa 9 e 10 de Dezembro de 2013
Hoje esperamos um dia verdadeiramente excitante!
Vamos fazer trekking para a montanha, dormir numa aldeia perdida no meio da selva e aprender muito acerca da natureza. Vai ser uma aventura e peras!
Saímos do nosso hotel pelas nove da manhã para uma volta de recolha dos restantes cinco companheiros para estes dois dias de emoção. Dentro da carrinha (tuc-tuc) já está um casal de trombudos franceses. Chamam-se Nassira e Silvain e raramente deixaram cair a máscara do descontentamento durante o tempo que durou a nossa saga pela floresta. Azar deles! Segue-se um solitário coreano. Chama-se Jack e é um simpático. Mais uma volta pela cidade até apanharmos os derradeiros passageiros. Um casal de irlandeses, Paddie e Anya, que com a sua chegada alvoraçam e contagiam os restantes com a sua alegria. Os franciús continuam de trombas! Paddie e Anya vieram da Austrália onde vivem. Não trazem qualquer plano de viagem, apenas se querem divertir com o que lhes surgir pela frente. E pela frente temos dois dias de intensa e frenética atividade.
Depois das formalidades processuais a que o guia estava obrigado entregando cópia dos nossos passaportes na Polícia de Turismo, lá seguimos ainda na caixa da carrinha até ao ponto onde deveríamos começar a caminhar. Não sem antes passarmos por um mercado local onde adquirimos alguns bens necessários a esta incursão pela floresta. Lanterna, fruta, repelente de insectos e papel higiénico, são algumas dessas necessidades que recomendamos a quem entrar nesta aventura.
Natália fotografa o Jack a atravessar o rio - no plano posterior o franciú de trombas como sempre!
Internámo-nos na selva caminhando em fila indiana com o nosso guia a fazer o papel que lhe competia. Passados não mais de meia hora, primeira paragem. Como eram horas de almoço parámos junto a uma cascata de águas límpidas e cristalinas que se despenhavam furiosamente nas rochas para mais tarde correrem mansamente em direção ao seu destino final. O mar!
Natália almoçando o seu arroz - até parece uma produção, mas era mesmo este o cenário
Almoçámos arroz frito embrulhado em folha de bananeira. Tudo material perecível de modo a não poluir o ambiente. Gostei e aplaudo mentalmente a ideia.
Depois de alguns minutos de repouso, ordem para partir. Há muito caminho a palmilhar. Muita serra a desbravar. Muito suor para escorrer. Não sei pelos muitos filmes que vi acerca da guerra no Vietname, sinto-me como um clandestino guerrilheiro em patrulha pela floresta. Mas isto, como é de calcular, sou eu a variar!
As águas do paraíso!
A primeira grande subida que se nos apresenta é íngreme e dum grau de dificuldade a requerer boa forma física. Dej, o nosso guia, recomenda-nos que o façamos devagar. Pelo caminho vai-nos dando lições de biologia e botânica, parando aqui e ali para nos surpreender com os seus conhecimentos acerca deste meio onde se sente como peixe na água.
O grupo começa a conhecer-se entre si. Tugas, coreano e irlandeses já descobriram afinidades, os franceses continuam casmurros que nem os dois bois-búfalo que há pouco connosco se cruzaram.
A caminhada pelos cerrados trilhos da mata continua. As surpresas sucedem-se. O cansaço é notório mas a alegria é constante. Em determinado ponto do trajeto Dej, puxa dos seus galões feitos conhecimento e dá-nos uma lição sobre térmitas que me escuso aqui de replicar.
Na verdade este jovem da estirpe Karem, conhece o terreno que pisa. Sabe das coisas e das causas. Das árvores e dos frutos. Dos animais e dos homens como se estes fossem o desenho da palma da sua mão. Estou verdadeiramente admirado!
Dej e seu facalhão - uma espécie de Macgiver das matas
Dej, possue um enorme facalhão, assim uma espécie de catana. Esta ferramenta é essencial ao desempenho da sua atividade. Com ela corta, cava, bate, afia, cozinha e sei lá quantos mais malabarismos consegue com o destro manuseio de tão importante artefacto.
A determinado ponto do caminho chama-nos. Quer que vejamos uma espécie de estalactites que determinada árvore produz. Parte umas quantas, guarda-as na sua cesta, prometendo surpresa para mais tarde.
Depois de caminharmos talvez uns 4 km, numa curva apertada do trilho, surge uma clareira onde está plantada uma espécie de palhota. Sentado no estrado que esta oferece um velhote. Nada de anormal. Nada de anormal não. Este ancião está ali por um motivo, e este, é fazer negócio. Vende cerveja, água e cola geladinhas. Isto no meio do matagal para além de surpresa ...é um luxo!
De regresso ao trilho que nos conduzirá ao nosso destino para o dia de hoje, continua a lição de botânica, biologia e sobrevivência. Tinha visto Dej cortar ao meio com o seu facalhão uma lata vazia de coca-cola (bem vos disse que a tal arma branca servia para tudo!) que colocou dentro do cesto que carrega como se este fora uma mochila.
Natália atenta aos preparativos - ao fundo o casal de irlandeses companheiros desta viagem
Numa clareira, sugere-nos que façamos uma paragem. Saca da catana, da lata de coca-cola cortada ao meio e dos tais pedaços de estalactite. Coloca os pedaços extraídos da árvore dentro da lata e batendo com o cabo reduz a pó os bicos daquela desconhecida matéria.
Dej - o mágico!
Ao desafio por ele lançado, uns dizem ser um adoçante substituto do açúcar, outros um afrodisíaco e outros ainda um medicamento. Nada disso! Dej pede-me o isqueiro, joga o pó ao ar ao mesmo tempo que acende a chama provocando uma pequena explosão tão grande quanto o bruá de espanto dos caminheiros presentes.
Retomámos caminho falando acerca do sucedido enquanto Dej saboreia o sucesso da sua iniciativa rindo a bandeiras despregadas. O dia escasseia. A luz definha. O nosso destino final aparece-nos ao virar duma curva na floresta depois de galgarmos mais uma das intermináveis subidas a que hoje tivemos de escalar.
Chegada à aldeia com Dej sempre e, primeiro plano
Ali estava ela. Uma aldeia perdida no meio das montanhas, onde a vida primitiva era a sua maior riqueza e porque não dizê-lo, o seu maior encanto. Casas em madeira plantadas em estacas e telhados de colmo. Gente de sorriso fácil e feições suaves acolhe-nos em alegre algazarra, especialmente por parte das crianças.
Jovem mulher e o seu filho - lindos!
Uma idosa desta tribo karem e habitante da aldeia
Os meus olhos deslumbram-se com o cenário com que deparo. ( Miguel, viajar é olhar! Volto a lembrar-me das palavras de Sophia.) Percorremos demoradamente as ruas desta comunidade, onde os locais convivem e coabitam em harmonia com os seus animais domésticos. Porcos, galinhas e patos em baixo, tribo Karem em cima!
As pessoas são bonitas e apesar da dificuldade do contacto linguístico, a linguagem dos gestos e sorrisos é universal. Estou em modo de espanto!
À porta do "hotel"
As instalações a nós dedicadas são colectivas. Uma barraca plantada em cima de estacas será o nosso “hotel” para esta noite e, cobertor e saco cama por cada um, o nosso leito. Antes que a luz desapareça, preparamos os nossos locais de pernoita e a seguir...jantar!
Dej, para além de tudo o que a ele referi, é também o nosso cozinheiro. A Natália insiste em ajudá-lo na confecção da janta que consta de sopa de batata, legumes salteados e ananás como sobremesa.
Para acompanhar, cerveja água e cola ao preço de 60 baths a lata. Depois do jantar, e no silêncio da noite estrelada, uma crepitante fogueira, onde para além de nós se juntam alguns dos aldeões. O nosso guia volta a surpreender-nos com uma série de jogos em forma de adivinha, tentando descortinar movendo um, dois ou três pauzinhos, a solução previamente anunciada. Para além de entertainer Dej, ainda rapa da viola e entoa-nos uma quantas músicas do seu ininteligível repertório. Para finalizar, ainda fez uma massagem tailandesa a quem dela quis desfrutar. Eu fui um deles!
Dormir é que foi mais difícil, apesar de ser algo com que já contávamos. A noite foi avançando na mesma e exata medida em que os ruídos da selva se esvaiam até imperar apenas o silêncio e o ronco de um dos nossos. Lá pelas seis da manhã a aldeia começou a despertar ao ritmo da natureza. Primeiro um guincho de bácoro esfomeado, depois um choro de criança arrancada aos sonhos da ingenuidade, mais ali passos apressados de quem busca no mato o pão. Em poucos minutos a vida ressurge esfusiante, prenhe de tarefas repetidas todos os dias e desde sempre. A manhã ganha os contornos cromáticos ditados pelo astro-rei surgindo imponente, como o devem ser todos os monarcas do universo.
O pequeno almoço surge na mesa qual manjar matinal servido em estabelecimento de reputada qualidade. Ovos fresco mexidos com cebola e tomate recém colhido, e ainda, tostas, geleia e ananás cortado em triângulos acompanhado de chá ou café.
O poiso do repasto - Eu estava a ver o homem a fazer as mortalhas, mas não lhe tirei fotos. Idiota!
Do poiso onde repasto, repouso o olhar num habitante que se dedica a demorada tarefa utilizando o seu facalhão. Aproximo-me curioso de caneca de café na mão. Alisa uma certa folha seca de que não vislumbro razão nem motivo. Com perícia de ourives, corta contra o dedo indicador as ditas folhas a fio de navalha de gume afiado. Fá-lo com a destreza e a paciência de quem já o fez milhares de vezes. O mistério adensa-se. Já não estou sozinho. A maralha também se deixou vencer pela curiosidade. Até que, o habitante local, puxa da sua bolsa de tabaco e enrola um cigarro, utilizando a tal folha como se fora uma mortalha. Estava resolvido o enigma das misteriosas folhas, que soubemos depois serem folhas secas de bananeira. Mais uma surpresa. Mais um ensinamento colhido.
Hora de partir e de novo nos embrenharmos na floresta cerrada. Dej conduz-nos por trilhos que só ele conhece. Continua a derramar a sua enciclopédia de curiosidades florestais a cada volta de cada vereda. Numa delas desce a ravina e apanha um grosso bambu que corta de forma exímia com o seu facalhão. Diz que servirá para mais tarde. Já nada me surpreende!
Danger is my business!
Depois de andarmos cerca de duas horas começamos a ouvir o som característico da água a despenhar-se nas rochas. O ruído foi ganhando vida, até que na volta de uma curva, depois de descermos uma perigosa e escorregadia ravina, ela ali estava à nossa frente. Uma espantosa queda de água com direito a banho para quem o quisesse tomar.
Natália e o elefante bebé
oh pra mim a andar de elefante!!
Sento-me e rebobino o extasiante dia de ontem. Revejo-o mentalmente. Nos lapsos que a memória tem, reparo que me esqueci do passeio de elefante que ontem fizemos. Montados no dorso dos poderosos paquidermes percorremos em fila indiana, os mesmos passos mil vezes repetidos por estes submissos animais. Ladeira acima, ribanceira abaixo, lá fomos em gritinhos medrosos, saboreando a experiência de viajar no animal mais poderoso da terra. O passeio terminou com os elefantes a caminharem dentro do rio com água pela barriga, e uma matilha de intrusos neles montados desfrutando de uma experiência, que a mim me deu mais pena dos bichos que prazer de neles me montar.
Estava eu embrenhado nestes paquidérmicos pensamentos quando Dej me chamou. Tinha com o tal bambu feito uma espécie de espada que entrava sem folgas numa espécie de bainha justa, também ela feita de bambu. Apanhou um papelão do chão, molhou-o, e introduziu um pouco no orifício da bainha. Depois pressionou com a suposta espada e o resultado era um estalido em tudo parecido com um tiro. Este Dej não parava de nos surpreender!
Dali rumámos à beira-rio já almoçados. A nossa caminhada tinha terminado. Aí montámo-nos numas jangadas feitas de bambu e conduzidas a varapau por experiente piloto destas andanças abalámos rio abaixo. No meio da molhada descida, ainda encontrámos de novo os elefantes, só que desta vez em alegre brincadeira. Enchiam de água a tromba e molhavam quem por eles passava. Contornámo-los sem sermos premiados com o duche e lá seguimos o nosso caminho.
No final dessa incursão aquática estava o nosso guia de quem nos despedimos e a quem eu faço aqui a justa homenagem.
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home