Diario de viagem dia 6
Pronto. Já chegámos a Espanha. São 21.00 horas estou em Baiona a pouco mais de 30 Km da fronteira onde pernoitaremos e ganharemos forças para o assalto final a Santiago de Compostela. Tenho dores um pouco por todo o corpo, mas estas mazelas são naturais para quem anda em cima dum selim de bicicleta vai para 700 Km e uma média de 6 horas por dia.
Saímos hoje da Póvoa de Varzim pelas 9.30 horas. A razão de uma saída tão tardia prende-se com o facto de havermos combinado encontra-nos com o Zé Lima (o famoso paraplégico que correu o país em cadeira de rodas no verão passado) e ainda com uma avaria de primeira hora no carro de apoio conduzido pelo amigo Coelho e gentilmente cedido pela Junta de Freguesia de Graça do Divor.
Lá conseguimos pôr a carrinha a trabalhar, mas suspeitando que a bateria estaria nas lonas.
Prosseguimos viagem pelo lindíssimo e verdejante Minho, por estradas estreitas mas de invulgar beleza. Não é difícil cruzarmo-nos por essas artérias com o melhor de dois mundos. Se de um lado podemos ver um carro puxado por uma junta de bois (dentro em breve vai voltar a ser moda!!) no outro pode acelerar uma potente máquina de desenho arrojado e com ocupantes de um “outro planeta” que não o do senhor que a pé e com a sua vara de tocar os bichos conduz pacientemente ao destino a imponente carga que iria jurar havia sido ali prantada a braço, forquilha e suor.
Pequenas hortas de agricultura de subsistência bordejam por largos quilómetros as estradas que vamos deixando para trás. Deixo-me enfeitiçar pela rudeza desta arte e sei e sinto que o melhor de nós reside naquilo que conseguimos arrancar da terra, mas pela trituradora da modernidade não existe lugar nem tempo para esperar pelo ciclo natural das coisas. Reflexos da vertigem de um tempo para o qual juro já não ter paciência!
Nisto chegamos a Esposende e num outro exercício de meditação estamos em Viana do Castelo onde fazemos uma paragem estratégica.
A visita a casa do Zé Lima foi de médico, mas deu para ver o quão ocupado anda este corajoso lutador, que contra ventos, marés, disposições e outras questiúnculas importunativas lá vai lutando pela causa que abraçou.
Mostrou-nos a sua nova handbike onde pretende de futuro competir e quem sabe fazer mínimos para os Jogos Paraolimpicos.
Despedimo-nos do Zé e da Paula combinando lá mais para o Verão um convívio mais intenso aquando da sua “revolta a Portugal”.
O bravo Zé Lima e a sua companheira Paula com a equipa em foto para a posteridade e para mostrar a nossa solidariedade para com este corajoso lutador.
Dali pedalámos até Caminha onde finalmente foi decidido adquirir uma nova bateria, já que não podíamos correr o risco de deixar o carro ir abaixo.
A pretexto desta aquisição deu para dar uma pequena volta por esta localidade raiana, repousar os olhos na beleza das mulheres minhotas, que curiosamente são predominantemente loiras, que me dizem ter a ver com a passagem dos soldados ingleses e franceses aquando da invasão destes últimos. São os chamados danos colaterais!
Em que meditará o joaquim Miguel enquanto aguarda pelo ferry que nos levará a Espanha?
Atravessámos o rio Minho no Ferry e partimos em direcção a terra de “nuestros hermanos” . Do outro lado do rio, A Guarda, ou La Guardiã espera-nos. Fui antecipadamente avisado de uma subida manhosa que iria encontrar, mas que se fez relativamente bem. Depois foi só rolar até ás 16.55 horas, altura em parámos em Oiã num bar de estrada e vimos o jogo de Portugal contra a Republica Checa, cujo resultado permitiu a Portugal ser o primeiro país a ser apurado para a fase seguinte.Mal entrámos no bar começou o hino nacional, nós de mão ao peito entoámos ali mesmo, vestidos de ciclistas em alto e bom som, A Portuguesa.
Revisitando esse momento acho que foi um bocado kitch, mas ninguém é perfeito e eu senti-me muito bem nesse momento.
Enquanto aguardamos o recomeço do jogo, eu tomo notas da jornada.
Lá vimos o jogo e emborcámos uma “porradaria” de “cañas”, coisa nada recomendável para quem anda de bicicleta, mas um dia não são dias, e afinal Portugal, no meio da bagunçada em que o país está a viver, lá nos conseguiu alegrar um pouco a alma.
De Oiã rolámos freneticamente até Baiona onde jantámos e pernoitámos.
Pronto. Gasto o latim todo a principio, depois quando quero falar um pouco do sitio de onde escrevo já não tenho vontade nem paciência.
Como não tenho net, este post bem como o de amanhã só entrarão na sexta-feira dia 13 de Junho, dia de Santo António e dia do 120ª aniversário do nascimento do Cristiano Ronaldo da poesia que dá pelo nome de Fernando Pessoa, que resultará numa enorme festa concerto no Terreiro do Paço e onde este vosso amigo vai estar a recitar parte do poema “ Tabacaria” do heterónimo Álvaro de Campos, com musica de Sam The Kid que irá resultar num disco e DVD do qual darei noticias lá mais para diante.
Fotos irão aparecendo à medida que tiver tempo para as colocar...
Ainda durante o dia de hoje, o mais tardar amanhã...o relato completo e na próxima semana no Jornal Correio Alentejo toda a história em versão jornalistica.
8 Comments:
o galo cantou,o pavão da quinta vizinha acordou,a matilha(chouriço,mantoirras e boca grande) farejarou a minha presença e lembraram que sou para eles o "macho alfa":levantei-me para os rever e ajudar a alimentar---que festa!Lamberam-me as feridas da chegada,saltaram e pediram às andorinhas que não se privassem de esvoaçar por cima das minhas memórias...
Respiro fundo e avanço para novo dia que antevejo me trará mais do mesmo,ou seja: terei que esperar mais um ano para me reenvolver em nova(sempre nova) assumida loucura de pedalar até Compostela e beijar Santiago--Prometo que assim será,com a mesma vontade como da 1ª e inolvidável vez.
Pelo caminho este ano não tivemos a inconveniente companhia,soprante,dos carros pesados ,que ora nos empurram para a frente ora nos puxam para trás e quase sempre assobiam desmesuradamente por cima dos nossos capacetes ou cascos ..Abençoada greve ou paro dos camionistas Portugueses e Espanhóis e de todos os outros que nas suas terras protestam contra os que teimam em nos condicionar a "petróleo-dependentes".Confesso que algumas pedaladas foram de raiva e contra quem nos explora e ,criminosamente ,empurra milhões de famílias para o lodo da miséria.
Foi no empedrado que mais senti quão dura é ou sérá a dura caminhada de quem vive neste planeta obrigado a suportar a gula dos especuladores.Foi aí que mais me solidarizei,em silêncio,com quem por todo lado dava sinais de inconformismo.
E então cantarei:contra a espéculação e corrupção lutar,lutar!
Lutas velhas alma nova!
um abraço Napoleão.
Joaquim Miguel
PS:parabéns pelos grandes êxitos de VIRIATO VENTURA e SAM THE KID nos céus de Lisboa.
Já faltou mais.Força Pulanito e restante pelotão.A descrição do Minho, depois de mais uma etapa cansada é sem duvida nenhuma de quem está vivo e feliz.forçaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa...
Grande aventura! Parabéns por ter atingido o objectivo.
Aposto que ontem à noite foi brutal! :D
Um abraço
Porra, pá. Não sabia que vinhas cá. Ainda por cima passei um raio de uma noite de uma sexta 13 a implicar com a mulher e os filhos sem ter que fazer...
Pronto, o que é preciso é que a viagem tenha corrido bem e que estejam todos de perfeita saúde.
...Escutava o Silêncio e preparava o diálogo com Santiago...
Entretanto o ZÉ LIMA prepara a sua nova "loucura".Voltará a passar por cá em Agosto,na sua cadeira de rodas adaptada ao desporto.Virá "MANEJANDO" a sua máquina com mais uns elementos(uma Senhora também) em defesa dos direitos dos deficientes e lutando por objectivos desportivos de maior envergadura
Tem três livros publicados.O último lançado no passado dias 10,na Feira Do Livro em Lisboa,em coautoria com PEDRO PINTO,jornalista da RPTN e com prefácio de JOSÉ ALBERTO CARVALHO .
Façam o favor de visitar o seu magnífico site---basta ir ao Google e procurar:DEFICIENTES ACTIVOS.
Missão quase cumprida.Força, muita força e um grande abraço extensível a esses teus compagnons de route.
Estou a fazer um esforço para tentar perceber o que pensas desta vida.
Nâo sei se sabes, mas perdi aquela mulher querida que um dia me deu a vida. Faleceu dia 9 ás 6 horas da manhã.Nada será como dantes, apesar dos seus quase 90 anos, deixa-me um enorme vazio no momento presente e a certeza de que irei ter muitas saúdades.
Um abraço e até breve.
Vocês merecem a minha admiração!
Desta vez o comentário não é para ti. Ou por outra é mas no que diz respeito ao Zé Lima, o paraplégico que percorreu o País numa cadeira de rodas, e pelo qual não tenho qualquer sentimento de compaixão (que sentimento tão negativo)antes uma grande admiração e um profundo respeito (mas será que estes sentimentos ainda existem?!) Detesto veementemente aquelas "cenas" do surdinho, do ceguinho, do aleijadinho. e de todos os detestáveis "inhos" de que
o nosso Portugalinho é useiro e vezeiro em usar? Quando será que Portugal cresce?!Quando será que crescemos?!Quando será que as pessoas deixam de confundar deficiência com invalidez?! pois nem sempre um deficiente é um inválido.
Desculpa-me a extenção deste comentário mas eu tinha de dizer estas palavras.
Um abraço
José Mestre
Creio que fui muito duro e deixei transaparecer uma certa insensibilidade em relação ao Zé Lima. O que eu queria (deveria) dizer era que muito mais do que um sentimento (negativo, repito) de piedade, de compaixão, os meus sentimentos em relação ao referido Zé Lima são de um enorme repeito e de uma profunda admiração
Um abraço
José Mestre - Entradas
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