Feira de Castro 2009
O tempo, esse cavalo alado que corre mais veloz do que o vento, faz com que se me descuido, me apanhe ainda a arrumar os cacos da feira anterior e já a próxima está de pau e pano em riste.
Falo dessa inevitabilidade anual que se repete há mais de 400 anos e que dá pelo nome de Feira de Castro, um marco mais que assinalável, histórico no panorama dos rituais de resistência das terras mais a sul, mais propriamente em Castro Verde.
Desde há vários anos (mais de dez) eu e alguns indefectíveis militantes da causa feirante, fazemos a nossa abertura da feira na sexta-feira que antecede os dois grandes dias, onde Portugal inteiro parece ter vindo desaguar à capital do Campo Branco.
Tanto eu como os meus apaniguados sentimos o peso desta instituição secular que terá começado por régia intervenção de Filipe I de Portugal, que por sinal era espanhol e a pretexto de angariar verbas para a construção da basílica ex-libris desta terra, terminou com algumas das feiras circundantes e juntou-as todas numa grande feira que tem lugar marcado no terceiro fim de semana de Outubro das nossas vidas e de tantas outras passadas.
Já aqui escrevi sobre a feira, sobre os ciganos, sobre os produtos, sobre outros tempos da feira, sobre histórias que fui ouvindo de gente mais velha, o que quer dizer que este polígono feiral já não tem muitos mais ângulos por onde o possa abordar sem correr o risco de me repetir.
Penso já ter escrito isto noutro local que não aqui no Pulanito, mas mesmo assim cá vai:
A Feira de Castro foi sempre um acontecimento que me esteve atravessado no peito, porque por incrível que pareça só aí fui pela primeira vez já contava 36 anos, embora todos os outros anteriores e desde que tenho consciência e vontade própria aí sempre quis ir; mas desde esse data jamais falhei um ano, sabendo os meus que das duas ou três datas sagradas que tenho, uma delas pertence à Feira de Castro.
O que me levou a falhar a 35 edições da minha vida prende-se com o facto de ter muito cedo partido das terras do Campo Branco e enquanto por lá vivi nunca me lá terem levado.
Depois lá para os meus 10 anos - já em Lisboa - dá-se um episódio curioso. Uma das lições do meu livro da quarta classe era acerca da Feira de Castro, coisa que como podeis imaginar, eu sabia de trás para a frente, de cor e salteado, ou mesmo a fazer o pino e foi a lição que curiosamente me saiu na prova oral do exame da quarta classe. Como podereis imaginar fiz um brilharete digno de impressionar os examinadores e graças à maior feira tradicional do Alentejo obtive uma nota de se lhe tirar o chapéu, julgo mesmo que foi um Muito Bom.
Com o passar dos anos e com a entrada na mocidade este acontecimento ficou subalternizado no meu consciente, que certamente estaria mais interessado em catrapiscar moçoilas de seios a rebentar blusas, do que em me preocupar com feirantes e ciganos.
Não que tal tenha acontecido até aos 35 anos, mas aquando do meu "chamamento à terra mãe", jurei que se fosse por mim esta feira jamais acabaria e cá estou a abordar a feira numa perspectiva que talvez ainda não tivesse feito.
Nos dias 17 e 18 de Outubro por lá andarei de máquina em punho à cata de momentos para eternizar. Lá irei ver o homem das fisgas cuja mulher tem sobre ele um ascendente que o deixa envergonhado (também gosto do lado sociopata da coisa!), e mais o homem da banha da cobra, mais os vendedores que fazem to taipal da camioneta o seu palco e que de microfone (sempre tapado com o lenço de assoar - penso que por causa do feedback!) pendurado ao pescoço prometem vender este mundo por meia dúzia de tostões e ainda leva de graça a lua e os satélites imaginários que estes conseguem pôr na carrada, que a maralha licita à nota de 20 Euros cada.
Bem já me estiquei que baste neste prólogo da feira mais a sul, que sendo mais que um sitio onde se mercam coisas, é aqui, neste terceiro fim de semana de Outubro que a diáspora baixo-alentejana se encontra para celebrar mais um ano das suas vidas.
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