Dia1: de Portimão aà Ilha da Culatra
Navegar é preciso, viver não é preciso. Começo assim a crónica de hoje, como um dos mais famosos versos de Fernando Pessoa, para vos dizer que a sensação de liberdade que é andar ao sabor do vento é nas minhas modestas palavras, simplesmente: admirável!
Começo agora a habituar-me à vida de bordo e à partilha de espaços, mesa e cama. Por exemplo a utilização da casa de banho, é daqueles que não sendo complicado é assim um bocado a dar para o malabarismo contorcionista.
A Casa de Banho!
A casinha de banho é um espaço exíguo de uma forma geométrica indescritível, onde teríamos de cortar as unhas para entrar, como diria Raul Solnado numa das suas afamadas histórias, que tinham lugar de inspiração em muitos destes minúsculos lugares.
Para se poder utilizar é necessário fazer uma série de manobras de modo a rentabilizar este importante equipamento.
Para utilizar a sanita, por exemplo para urinar (para ser menos incómodo para os meus leitores), é necessário através da bomba esvaziar o receptáculo, depois é fundamental voltar a bombear água fresca para a sanita, isto sem nunca nos esquecermos de abrir as quatro válvulas para que tal operação seja bem sucedida. Ainda no ano passado, esta operação não tendo sido executada com método adequado e houve merda com fartura pelo barco todo. nas palavras de João António o protagonista da história“ havia cagalhão por tudo quanto era lado ou buraco” tendo o Amadeu (comamdante) e o Filipe Neves (imediato) de arregaçar mangas e andar à caça desse raro animal de cor acastanhada que tem no nauseabundo cheiro o seu mecanismo de defesa.
João António foi de novo instruído acerca do método de utilização de tão periclitante equipamento, tendo-lhe sido recomendado especial cuidado com os papéis, que jamais deviam ser jogados para dentro da sanita. O papel higiénico depois de utilizado na limpeza dos alvos cuzes deveria ser aventado escotilha fora.
O nosso João aquando de uma nova utilização da casa de banho, cumpriu na integra a ritual da cagada, abrindo e fechando válvulas e atirando escotilha fora o papel como lhe havia sido sugerido, só que tanto o Amadeu como o Filipe esqueceram-se de o avisar sobre a direção do vento, tendo sido então que começaram a levar com o papel higiénico na cara, não se conseguindo livrar da merda do João, nem mesmo depois deste haver aprendido a lidar com tão importante peça de relojoaria micto-cagatória.
Voltando ao dia de hoje e agora em ambiente mais aliviado e com melhor ambiente olfativo, para vos dizer que navegámos sempre com a costa à vista.
Qualquer pessoa que olhe a Costa Algarvia deste ângulo onde agora me é dada a observar, tem na sua presença uma das maravilhas de Portugal.
As pequenas ou longas praias de finas areias douradas, são uma constante no cenário; as grutas e formações rochosas naturais são outro dos atrativos. O alvo casario desenhando o recorte da paisagem que na sua grande maioria casa perfeitamente com a envolvente. Noutros casos temos exemplos de como a ganância destrói um património que é de todos e refiro-me essencialmente a Armação de Pêra, Albufeira e Quarteira que, em minha opinião, são três exemplos dos atentados que esta explorada costa foi vítima.
Regressemos pois aqui ao nosso balouçante poiso. A viagem até à Ilha da Culatra foi feita sem sobressaltos e com uma réstia de vento que permitia retirar desta viagem à vela, o prazer único que é recorrer à força da natureza para nos deslocarmos de um lado para o outro.
Já almoçámos por aqui. Depois de fundeado o barco, regressámos ás atividades inerentes á tripulação que passam essencialmente por três importantes vertentes: comer, beber e dormir!
Passámos a tarde a dormitar, tentando recuperar de uma noite quase perdida.
Quando o Sol se quis esconder para lá da linha do horizonte, deixou-nos apenas o silêncio da contemplação e, nesta certeza que é estarmos vivos, presenciámos na quietude crepuscular o esbatimento de luz que é o último raio do astro rei, como que a dizer-nos que amanhã cá estaremos de novo.
Com o Dinky fizemos a distância que separa a embarcação da aldeia da Culatra, uma aldeia cuja arquitetura popular denuncia a falta de ordenamento, mas que ao mesmo tempo lhe empresta uma beleza que não consigo verdadeiramente explicar. João António diz-me que estamos em Cuba, já que o tipo de construção, o colorido das casas e o próprio ambiente lhe sugere a ilha de Fidel Castro.
Jantámos amêijoas e choquinhos fritos e, agora, de regresso ao barco preparamo-nos para usufruir de uma noite de calmaria ambientada pelo gosto musical do Amadeu que é sempre uma mais valia para potenciar o ambiente.
Aprendi hoje que a energia a bordo, é coisa verdadeiramente valiosa, portanto há que poupá-la ao máximo, o que faz com que o ambiente ainda seja mais bucólico e mesmo contemplativo a avaliar pelo silêncio dos meus companheiros.
Posto isto, só me resta dizer que amanhã velejaremos o dia inteiro em direção a Cádiz de onde me pronunciarei acerca desse dia 2 que promete ser de calmaria.
Até amanhã.
3 Comments:
Que belo relato, como sempre cativas-nos…. já nem te lembras que não sabes nadar ( coisa irrelevante) agora a sanita sim imagino! deve ser tarefa difícil com 6 gajos cagadoiros a bordo! Ufa!
bjs olhos castanhos
Nap,amigo!Para outras necessidades a bordo não me vou pronunciar...mas,porra,para mijar!Epá, para mijar é só escolher o estibordo ou o bombordo,em função da direcção do vento.Ningém vai levar a mal,desde que não mijes para dentro da embarcação!Digo eu!
Em Cadiz dá um abraço ao Romerijo(Porto de Santa Maria) e manduca uns pacotes de camarão,lagosta e lagostins,por mim,abrigado do levante pelas vetustas arcadas...
Boa mareagem!
jm
Fátima Carvalho,
"C'est la belle vie, dit donc!! :) Há que aproveitar os bons prazer da vida, nem que seja a utilização do WC num barco looool!! Bjs"
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