Comprar Versus Alugar!
São 3.50 da madrugada e a insónia veio para ficar. Vai daí, entre o olhar para o tecto na escuridão e agarrar-me à companhia das teclas e do ecrã foi uma decisão que não me custou muito a tomar e aqui estou.
Já que aqui estou, vou-vos hoje falar dum tema que já publiquei há uns bons oito anos e onde defendia que havia terminado a hora (salvo raras excepções) em que adquirir casa própria deixava de ser uma opção sensata.
Esta semana, num dos programas matinais duma rádio nacional, um carismático e escutadissímo comentador económico propalava aos quatro ventos as vantagens de alugar tecto em vez do adquirir.
Escrevia eu no ano 2000 e que agora recupero actualizando alguns factos e decisões que agora me vieram dar total razão. É claro que então tive algumas trocas de argumentos com leitores e bancários que não compartilhavam (e estavam no seu direito) com a minha radical posição.
Escrevia eu então:
Portugal é um dos países da Europa com o maior número de proprietários, isto porque desde os finais dos anos sessenta, aquando da implementação da propriedade horizontal, o Zé povo desatou a comprar casas e sobretudo apartamentos, baseando-se na lógica financeira, de que era melhor pagar uma mensalidade que reverteria em seu próprio beneficio, do que pagar a renda a um senhorio, o que de certo modo é verdade, e em tempos idos foi um interessante investimento.
Nos dias que correm, e salvo algumas excepções, esses benefícios já não são tão interessantes, senão vejamos:
Se tivermos por base um apartamento que custe 125.000 euros, e se fizer o empréstimo na totalidade, pagará nos próximos 30 anos (quando escrevi isto ainda não havia 40 e 50 anos) e se a taxa de juro indexada se mantiver inalterável durante esse tempo qualquer coisa como 613 euros por mês, (estas contas eram de 2000, entretanto a coisa alterou-se para bem pior) mais o tal seguro de vida obrigatório, que ainda estou para saber porquê, que custa cerca de 20 euros durante os mesmíssimos 30 anos.
Terá que pagar ainda a contribuição autárquica (hoje IMI) que nunca será inferior a 800 euros por ano assim como a taxa de condomínio do edifício que regra geral será de 40 euros por mês.
Terá ainda que contribuir com a parte que lhe tocar para as grandes obras que o edifício vier a ter ao longo desses anos, nomeadamente pintura, infiltrações, substituição de portas e outras obras que sempre acontecem.
Isto quer dizer que apuradas as contas o seu apartamento vai-lhe custar qualquer coisa como € 750 euros por mês se adicionarmos, dividirmos ou multiplicarmos pelos anos do empréstimo as quantias a este indexadas.
Isto para não falar das obras portas dentro, que durante 30 anos hão-de ser algumas, especialmente ao nível da cozinha, casas de banho, pinturas ou o fecho de terraços, transformados em marquises tão ao gosto português.
Podemos sempre argumentar que estamos a pagar uma coisa que é nossa e que podemos sempre vender. De facto tal acontece, mas se não for para comprar uma mais pequena e num sítio mais distante, raramente ficará a ganhar com a venda, até porque terá sempre que comprar outra casa para viver.
Na minha modesta óptica, esta é uma simples operação de mudança de senhorio (mas sem as preocupações e obrigações inerentes, que passam a ser suas embora a casa não o seja), embrulhada num papel mais vistoso, logo mais atraente.
Por outro lado se pegar em pouco mais de metade da quantia aqui exemplificada, poderá alugar o mesmíssimo apartamento, não tendo que nele efectuar qualquer obra, pagar condomínio ou contribuição autárquica. Se se incompatibilizar com o vizinho, com o companheiro ou companheira, pode pegar na trouxa e rapidamente mudar de casa.
Se o local onde mora começar a ser muito ruidoso, inseguro ou pouco recomendável só tem que dar o prazo estipulado em contrato e recomeçar vida noutro local que lhe ofereça melhores garantias.
Se arranjar emprego noutra cidade, não tem que pagar duas rendas enquanto não soluciona o problema do apartamento que deixou para trás e tantas outras mais valias, especialmente ao nível da mobilidade, como aqui ficou demonstrado.
É claro que isto é só um exercício comparativo não aplicável a toda a gente nem a todas as situações, mas até agora uma coisa que parecia indiscutível, começa a ganhar contornos e argumentos a seu favor especialmente nas grandes cidades.
Pronto. Isto era o que eu escrevia há largos anos atrás. Julgo que nos dias que correm e com a dramática crise no sector imobiliário, com o governo a deduzir no IRS parte do valor da renda, com os empréstimos a 40 e a 50 anos pasme-se, os nossos jovens (e não só) continuam por via genética a interiorizar uma das mais famosas publicidades que terá mudado a maneira de pensar dos portugueses e que rezava assim “ Quem casa quer casinha…Pois, pois J. Pimenta”.
Esta frase foi culpada do câmbio das mentalidades de então no que se refere à aquisição de casa própria, coisa que era uma miragem para a classe média de então.
Só para compor o ramalhete, conheço alguns casos verdadeiramente demonstrativos da dependência que alguns portugueses têm de sofrer na pele, pelo simples facto de pensarem que ao adquirirem a sua casinha estavam a fazer o investimento da sua vida, estavam afinal a assinar uma escritura de escravidão e subserviência perante as implacáveis entidades bancárias.
Conheço pelo menos dois casais, cujos casamentos há muito terminaram, mas que são obrigados a manter não por uma questão de fachada, mas sim por não se conseguirem ver livres da casa que é dos dois e não poderem comportar duas rendas de casa.
Tenho ainda uma amiga, cuja vida empresarial lhe correu mal, e que contraiu um empréstimo que a obrigava a pagar 1.200 euros ao banco mensalmente. Agora trabalha por conta de outrem, ganha 800 euros, teve de arranjar um segundo emprego só para pagar a renda ao banco, já que não consegue vender o imóvel, mesmo a um preço muito abaixo do seu valor de mercado.
Parece que finalmente alguém abriu os olhos e as pessoas como esta minha amiga que vive neste calvário há cinco anos poderá fazer um interregno nesta obrigação e apenas pagar uma renda que esteja dentro do seu comprovado orçamento.
Isto apenas acontece porque o estado foi obrigado a intervir, já que por livre iniciativa dos bancos e apesar de todos os dias lhes entrarem casas pela casa dentro, não podendo as pessoas pagar as mensalidades com que se comprometeram, estes só se preocupavam em investir o dinheiro dos depositantes em fundos “tóxicos” e de rentabilidade virtual e especulativa, criando a espiral de crise e desânimo em que vivemos e que para serem salvos da falência, teve que o dinheirinho dos contribuintes servir de fiduciário.
Entretanto continuam a assobiar para o ar, pois sabem perfeitamente de quem é a culpa do “Estado a que isto chegou” que como Salgueiro Maia um dia exemplificou, foi a razão que o levou a dirigir os chaimites para o Quartel do Carmo.
Parece-me que isto está a precisar de um ciclo novo. Parece-me!
Mas quem sou eu para me pôr a fazer futurologia.
Sim. Quem sou eu!
Etiquetas: aluguer de apartamentos, comprar apartamento, Orçamento Geral do Estado
4 Comments:
Aí está um assunto muito sério,com o qual não se brinca.
Parece começar-se a poder ver alguma luz ao fundo do túnel.
Tanta gente asfixiada com os encargos a que o facilitismo no acesso ao crédito tem levado.
Sempre a mesma coisa"as duas faces da mesma moeda".Por lado um lado a possibilidade de adquirir património e ter acesso a bens de consumo (lado bom),por outro o não se conseguir auferir rendimentos suficientes para fazer face às despesas fixas mensais(lado péssimo).
Porque é preciso viver,as pessoas têm que viver,têm esse direito natural,parece-me bem as medidas de apoio às pessoas e às famílias que o Governo está anunciar.
Mesmo que seja difícil a aplicação de tais acertadas medidas sou dos que,apesar de não necessitar directamente delas,me agrada muito saber que a vida pode melhorarar,tem de melhorar, para todos.Vou por aí....
Quero ver as pessoas sorrir!
E há sorrisos que nunca se devem perder.
Haja Saúde
JM
Às quatro da madrugada o passarinho cantou, e tu ,(mas que grande insónia!)divagavas..,como pessoa interessada que és ,e é assim que eu te admiro.Com razão ou sem ela,certos ou errados, o importante é pôr os neurónios a trabalhar e não se limitar a passar uma bela noite de sono e de manhã,fazer um bruto penteado.Ah!Ah!Ah!
Beijinhos da prima
"as forças numa sociedade capitalista,se deixadas sem controle,tendem a fazer o rico mais rico e o pobre mais pobre"
JAWAHARIAL NEHRU(1889-1964)--o pandita!!!!!!!
UPS!
"A forma de governo mais adequada ao artista é a ausência de governo.Autoridade sobre ele e a sua arte é algo de rídículo"
OSCÁR WILDE(1854-1900)
UPS!
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