The Times They Are A Changin
Os Tempos Estão a Mudar
Quando saiu a notícia que Bob Dylan
fora galardoado com o Nobel da literatura rejubilei de alegria. O que não
esperava e me deixou incrédulo, foram os comentários depreciativos de alguns
escritores de renome da nossa praça.
Por exemplo: a escritora Alice Vieira
escreveu no seu Facebook: — “Digam-me que é aldrabice. Digam-me que
estão a gozar comigo. Digam-me que o Bob Dylan não ganhou o Nobel da
Literatura”, adiantou ainda no mesmo espaço “Se fosse aos galardoados anteriores, devolvia o prémio. Juro”. E
para compor o ramalhete do destrambelho de que foi possuída, ironizou: “Estou
a preparar a candidatura do Quim Barreiros para o próximo ano”.
Caramba! Mesmo que ironicamente
comparar o nosso bem disposto Quim Barreiros com um dos grandes mestres da
palavra, é o mesmo que comparar o cú com a Feira de Castro, curiosamente, o
local onde matuto nesta crónica enquanto naufrago rua abaixo neste mar de gente
que desagua no largo onde esta peregrinação se repete ano após ano há quase quatrocentos
deles.
Lá atrás, sopradas pelo vento
(para fazer jus ao Dylan em que penso), ainda ecoam as vozes dos homens e
mulheres desta terra que perfumam de
alentejanidade o ambiente festivo que
por aqui se vive.
De regresso ao agraciado dou
comigo a pensar na justeza do prémio atribuído. O homem tem trinta e sete
discos editados em cinquenta e cinco anos de carreira. É considerado um dos
grandes poetas contemporâneos sendo a sua obra estudada em várias universidades
do seu país. Influenciou múltiplas gerações de músicos e de melómanos. Combateu
com a sua poesia e a sua música a política norte-americana nomeadamente a
intervenção militar no Vietname. Bob Dylan é ainda para além de músico,
compositor, pintor, escritor, poeta e pontualmente ator, tendo dedicado toda a
sua vida à criação artística e, nas palavras de alguns nomes sonantes da nossa
praça, não é merecedor do galardão em causa?
Mergulhando neste tsunami
humano onde me perco, vislumbro por entre a maralha um homem de costas de
guitarra ao peito e chapéu negro na cabeça. Parece-me ser o homenageado desta crónica. Na
minha assumida senilidade parece-me tocar os primeiros acordes da música The
Times They Are A Changin. Aproximo-me
para me certificar do que os meus ouvidos parecem escutar.
Não é o Dylan mas sim o João
Pestana, um outro trovador que há muito anima os dias da feira com a sua
voz límpida e melodiosa.
Retornado à realidade de onde
por momentos me alheara, dou comigo a rir-me de mim mesmo e penso que, lá para
os lados da Suécia os tempos estão mesmo a mudar. Eu, daqui, da minha
insignificante pequenez saúdo-lhes a
coragem e a clarividência.
Publicado no Correio Alentejo de 20/10/2016
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