Uma Coisa Assim Em Forma de Livro!
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Hoje, 23 de Abril, é o Dia Mundial do Livro. É ele, umas
vezes em forma de porta, outras, de janela por onde entram na intimidade de
quem os escreve, esses pássaros curiosos a que alguém um dia deu o nome de:
leitores!
Pessoalmente gosto do objecto livro. Gosto de o acariciar;
de o folhear e, sobretudo, de o cheirar. De lhe sentir em cada carácter
(aprendi que não se escreve caracter, tal nem sequer existe! ),
o pulsar do coração de quem o escreveu.
Como autor, vivi ansiosamente o nascer de cada um deles,
como quem assiste ao nascimento de um filho (desculpem a banalidade da analogia,
mas não encontro outra), como quem sabe que estes subsistirão muito para lá da
minha existência, e isso, causa-me um certo frenesim. Uma coisa assim em forma
espanto!
Aqui há tempos vivenciei um momento causado por esse objecto
mágico que hoje se celebra que jamais olvidarei.
Não sou um escriba conhecido, nem pouco mais ou menos, vendo
entre 1000 e 2000 livros e muitos deles em circuito fechado, feiras e apresentações.
Estava em Lisboa. Apanhei o metro para a Baixa na estação de
S. Sebastião. Eram talvez umas 15.00 horas, logo, pouco movimento nos cais e
dentro das carruagens.
Ao entrar, reparei que uma senhora estava absorta na leitura de um livro.
Reparei ainda que o consumia avidamente folheando página atrás de página.
Sentei-me ao seu lado pedindo licença. Afastou as pernas,
mas não os olhos da leitura que estes descodificavam em forma de impulsos que
enviavam para o cérebro e, que este, qual interface automático, qual placa
giratória redirecionava para o coração em forma de emoção.
Esta mulher lia palavras por mim escritas. Palavras que
juntei numa mais que provável noite de insónia onde os personagens por mim
gerados ganhavam vida, subindo-me pelas artérias acima, matraqueando-me os
ouvidos, reivindicando vida, implorando que os não matasse. Agora! Agora, eram
companheiros de viagem daquela leitora anónima desse livro que ainda por cima
se chama: FADO.
Depois eu saí nos Restauradores e ela... não.
Perdoem-me a imodéstia. Suplico-vos que não me julguem pelo
que acabo de vos segredar. É apenas um momento de fraqueza. De franqueza. É tão
só um orgasmo de lucidez. Uma coisa em forma de livro que hoje quis convosco partilhar.