quarta-feira, janeiro 22, 2014

Ko Si Chang - ùltimo dia - 21 de Dezembro de 2013

 Os nossos companheiros dos últimos dias. Lou e Ali, que voltaremos a ver em Junho quando por aqui passarem.

Voltámos a acordar antes do galo. Isto tem a sua razão de ser. Na ilha não há rigorosamente nada para fazer à noite. Daí a diversão seja a cama, com tudo o que isso implicar, incluindo dormir cedo.

 Os canais de televisão são-no às dezenas. Paletes mesmo. Mas curiosamente todos em línguas que não sei descodificar. Vai daí que dormir cedo é um dos planos a ter em conta.


 Ko si Chang - vendedores de rua

Após a minha obrigatória visita ao café da senhora simpática que me parece conhecer desde sempre, dei uma volta em modo suave pelas ruas das imediações. Durante esse périplo exploratório, diria mesmo, cusco da vida dos nativos que vivem portas afora, como de resto já foi referido, dei com o responsável da poluição sonora matinal. Parei a motoreta e por ali fiquei fingindo interesse numa qualquer flor que fingia fotografar. O artista tinha na rua, montada uma espécie de estação de rádio, cujo som propagava, via altifalante por aquela, e ao que julgo, por outras ruas vizinhas. Estava portanto na presença de um amante da radiotelefonia, que levava a seu bel-prazer e até aos seus ouvintes o som do seu gosto musical, bem como as certeiras palavras que ali debitava para quem o quisesse ouvir e mesmo para quem o não quisesse.

 cemitério budista

 Resolvido o mistério voltei para casa e contei à Natália que não quis perder a oportunidade de por ali passar quando fomos para a praia. Atenção. Eu avisei que vos ia trazer notícias que o não eram. Portanto nada de me interpretarem mal. Creio que até final desta epopeia escrita, ainda aqui trarei mais uns quantos não episódios, só porque me quero entreter a escrever e, como tal, quem aqui tiver chegado é capaz de começar a pôr em causa a minha sanidade mental.

Amanhã será o nosso último dia. Como não sei se vou ter tempo para escrever, resolvi-me a fazer futurologia e em jeito de comentário final deixar-vos a minha impressão acerca desta incursão asiática. Até agora tem sido extasiante, surpreendente, cansativa e aventureira, mesmo a pedir mealheiro para próxima viagem.

Foram dias excitantes de descoberta. Vivemos 21 dias ao sabor do calendário e da nossa vontade. Adorei não termos programa definido. Gostei do estilo free style das nossas férias. Surpreendi-me e julgo ter surpreendido a Natália. Mais que colaborante companheiro de viagem, julgo ter sido um cúmplice de corpo inteiro. Deliciei-me com as gentes, a gastronomia, a paisagem e a cultura dos povos que visitei.

Retenho três grandes momentos. Os dias de treckking na selva, a descida do rio Mekong e o místico encontro com o monge no alto daquele monte. Surpreendeu-me a minha diabetes que sem fazer nenhum regime especial, baixou para leituras aceitáveis, comparadas com as dos últimos tempos. Apesar dos sete fusos horários de diferença; de estarmos em países diametral e culturalmente opostos, senti-me muito mais seguro por aqui, do que no meu próprio país.


 Ainda vos podia contar a história desta mota de água, mas creio que já era abusar da vossa paciência.

Não vos vou maçar com mais um dia de praia com águas obscenas de quentes. Não vos quero aborrecer com mais um dia igual ao de ontem, com temperaturas a roçar o absurdo. Não! Não vos quero enfadar com mais um dia de puro e dolce fare niente. Longe de mim ficar aqui de novo a descrever-vos mais um pôr-do-sol daqueles de cortar a respiração. Não! A única coisa que vos quero dizer é que estou prestes a acordar deste sonho. Que estou quase, quase a voltar à minha pobre realidadezinha, aos meus problemas existenciais, ao términus do meu novo livro e ao início de escrita do romance que tenho retido na cabeça à espera que o transponha para o papel.

 Uma das últimas fotos de férias

E pronto, aqui fica este exercício escrito na forma de um olhar.
Como se apenas captasse o que o que estava no meu horizonte visual e, de uma foram crua, sem grandes preocupações estéticas no que à escrita diz respeito, fui tomando nota desses olhares que agora convosco reparto.

 desculpem lá. Tinha de colocar esta...só lhe falta a palavra fim entre o barco e o pôr-do-sol

Espero que consigam viajar nas minhas palavras e que retirem delas, parte do prazer que senti neste périplo por estes dois países da Ásia: a Tailândia e o Laos.

Escrito por pulanito @ janeiro 22, 2014   3 comentários

terça-feira, janeiro 21, 2014

Ko Si Chang 20 de Dezembro de 2013

Natália montada na nossa máquina de dar voltas à ilha

Acordámos às seis e meia da manhã. Fizemo-lo ao som estridente duma ladainha debitada por uns altifalantes de feira que enxameiam a rua adjacente a este parque residencial. Ainda não descobri o propósito de tão inusitado programa. Não sei se é coisa religiosa, mas do que me é dado a observar, não vislumbro nenhuma movimentação motivada por tão irritante vozearia.

Hoje. Agora mesmo. Tomámos uma decisão!

Entre ir para Bangkok e ficar em Ko Si Chang, ganhou o sossego da ilha (se não fizermos caso ao parágrafo anterior!) Teremos assim os dois derradeiros dias de praia antes de iniciarmos a jornada de regresso. Ou seja tempo de sobra para “encher chouriços” e aqui vos trazer notícias que o não são, mas que me esforçarei para parecer que sejam.
 Gastámos parte da manhã a reorganizar o prolongamento da estada. Comunicar essa decisão à responsável pelo nosso alojamento voltou a revelar-se tarefa inglória.
Como não nos fazemos compreender, deixamo-nos ficar. Há de lhes parecer estranho e nessa altura será ela a vir atrás de nós e reclamar o pagamento. Meu dito, meu feito. Não demorou uma hora até que aparecesse!
 Café onde a cada manhã mato o meu vício matinal

Já conhecemos a ilha de ponta a ponta. Os locais inclusive já nos saúdam. A senhora onde tomo café há três dias já nem me pergunta o que bebo. Serve-me apenas o café, sempre acompanhado do seu genuíno sorriso. Julgo que não demoraria muito a sermos absorvidos pela comunidade local, caso nos passasse uma coisinha má pela boneca e decidíssemos por aqui ficar.

Já certamente repararam que a minha primeira ideia acerca da ilha, deu uma volta de 180º. Agora, para não passar o dia na praia, resolvemos deambular pela ilha de manhã. Nesta em que estamos, daqui, da beira-porto, avistamos no alto de um penhasco aquilo que parecia ser um miradouro, um ponto interessante a visitar e onde poderíamos fazer mais algumas fotos para mais tarde recordar, como dizia o velho slogan da Kodak.

O Monge aconselhando os fiéis

Montados na nossa scooter, galgámos a íngreme subida por entre a densa vegetação que bordeja o estreito caminho que aí nos conduz. Aí chegados deparámo-nos com uma cerimónia íntima. Uma família tailandesa, porventura de origem local, absorvia com as mãos colocadas em prece, aquilo que me pareceu ser uma encomendação, um aconselhamento espiritual levado a cabo por um velho monge, para quem eram dirigidas todas as atenções desta prole. Sentado na tradicional posição budista, o religioso debitava um imperceptível discurso aos nossos ouvidos. Os destinatários da sua palavra, a avaliar pela atenção prestada, pareceu-me absorverem-na com fervor e assentimento.

 Já com umas centenas de degraus nas pernas

De modo a não perturbarmos a intimidade da cerimónia, retirámo-nos silenciosamente. Já fora do recinto, deparámo-nos com uma escadaria. Esta, segundo as palavras de um polícia que por ali estava, conduzia ao ponto mais alto da ilha, e era espetáculo a não perder. Resolvemos subi-la, apostados no deslumbramento da vista que se pressentia. A escalada foi demorada. Os lanços de escada repetiam-se parecendo mesmo infindáveis. Depois de uma largas centenas de degraus lá atingimos o cume. O esforço foi largamente recompensado. A paisagem que dali se avistava era extasiante, esmagadora mesmo! Dali podíamos ver toda a ilha. Aos nossos pés a localidade portuária onde a vida parece mais acontecer. As estradas que serpenteiam a ilha mostram-nos outros locais para mais tarde desbravar. O mar do lado da aldeia, pejado de plataformas que são armazéns marítimos, conspurcam a paisagem. Ainda bem que conseguimos passar estes dias de costas voltadas para tão catastrófico cenário.
O deslumbramento do visitante
 Marco no alto do monte com as coordenadas de GPS. Apenas uma curiosidade

Depois das inevitáveis fotos, encetámos o caminho de regresso. Esperavam-nos o mesmo número de degraus, só que agora na forma descendente. Ao chegarmos ao miradouro, reparámos que a tal família partira, restando o sorridente monge na solidão do monte, na proximidade espiritual daquele a quem venera, e que, por via dessa entrega, lhe desenhou no rosto o semblante da serenidade.

 O culpado pelo encontro místico


Chamou-nos e convidou-nos a sentar à sua frente na posição budista, em posição inferior como é preceito. Num inglês macarrónico mas perceptível, perguntou-nos de onde éramos. Ao afirmarmo-nos portugueses ficou algo admirado. Sabia passagens da nossa história, nomeadamente acerca da epopeia marítima dos nossos antepassados. Demonstrava estes conhecimentos com gestos largos como que a abranger o mundo inteiro.

Nisto, inverteu o discurso e debitou uma ladainha na sua língua mãe. Molhou numa tina à sua frente uma pequena vassoura e aspergiu-nos por duas vezes, voltando a entoar palavras incógnitas ao nossos conhecimento.

Senti-me abençoado. Para mim este terá sido um dos momentos mais emocionantes desta viagem. As palavras proferidas não as sei traduzir, mas que fui invadido por uma súbita e momentânea paz, disso posso-vos falar. Foi assim um momento fugaz. Um eterno e longo segundo, aquele em que fechei os olhos e experimentei a sensação dos beneditos.

Sou um céptico. Nunca senti nenhuma espécie de chamamento. Mas, senti nas palavras deste velho desdentado, um verbo antigo, um conhecimento milenar, uma fusão de sorrisos, que fizeram deste instante, um momento a guardar em lugar de destaque no pedestal da memória.

O Monge Dom, com o bordão esculpido por suas mãos

O Dom, assim se chamava o velho sábio, quando com ele deparámos após a descida do alto do penhasco, esculpia um bordão de caminheiro. Estava quase terminado. A beleza do desenho nele trabalhado, fez-me acreditar que aquele ancião, para além daquilo que era óbvio que era, era também um artista.
escutando as palavras do sábio monge

Este homem, cuja imagem invade agora o meu pensamento, era talhador de uma só ferramenta. Um pequeno formão com que esculpia a madeira, surgindo nela e em baixo-relevo os motivos da sua obra. Encimado por uma perfeita flor de lótus, Dam, foi-nos explicando, ao mesmo tempo que com dedo percorria, os restantes motivos do seu ornato. Serpentes, flores, dragões enleavam-se varapau acima numa magnifica composição plástica.

Ainda pensei pedir-lho ou mesmo comprar-lho, mas, inibi-me com receio de o ofender.
Seria um tesouro inestimável. A recordação maior de um momento sublime e único.
Fiquei-me pelo pedido de autorização para o fotografar com ele na mão.
Também não fica mal assim!

Os dias de praia são dias de lazeira. Não fui ainda afectado pela minha habitual impertinência. Aceito de bom grado a benesse de aqui estar. Praia quase deserta. Água à temperatura de caldo. Sombras a perder de vista. Cerveja barata e comida de fácil digestão. Que mais posso pedir? A escrita e a leitura intervaladas com uns mergulhos ocupam-me grande parte do tempo, assim sendo, não tenho muito a tendência de olhar para o relógio. Deixo apenas o tempo acontecer.

 

Dias felizes...quase, quase a terminar

O sol naufragou de novo no oceano, suicidando-se nas águas profundas onde decidiu dar por finda a sua jornada.

Escrito por pulanito @ janeiro 21, 2014   3 comentários

segunda-feira, janeiro 20, 2014

Tailândia - Ko Si Chang 19 de Dezembro de 2013

Pequeno almoço em Ko Si Chang

A três dias de regressarmos à pátria do vinho tinto, finalmente o O dolce fare niente que ambicionávamos. Dormimos como dormem os justos despertando unicamente por volta das 8.00 horas da manhã. Com as mercas feitas ontem tomámos no nosso minúsculo terraço um retemperador pequeno-almoço.

 Dou um pequeno passeio em frente à casinha onde habitaremos os próximos dias e acho-lhe uma graça imensa. Tem assim um ar colonial e está irmanada por outras de igual projeto, mas pintadas de cores diversas mas sempre garridas. A nossa tem aquela cor que não sei definir mas a que há muito chamo de “azul do carro do Mendes”, um tonalidade entre os azuis celeste e marinho.

Tenho dois hábitos matinais. Café e jornais. Como os jornais aqui estão fora de questão, parti à procura do café. Percorri as estradas pela direita como por aqui é preceito e voltei a parar à porta do 7/11 onde tinha reparado existir uma espécie de máquina de café. Como tudo estava escrito na língua local tive de pedir ajuda a uma funcionária, mas quem se prontificou a ajudar-me foi um outro colaborador que para além de tailandês, era também portador de síndrome de Down. Resultado: o rapaz tinha a melhor das vontades em me ajudar. Queria mesmo fazê-lo a toda a força, mas eu não me conseguia fazer entender e ele, por seu lado, também não me ajudava.

Desmanchámo-nos os dois a rir, já que a única palavra que em que coincidíamos era “café”, mas o raio da máquina apenas deitava água quente. Registei a boa vontade do rapaz, paguei a beberagem a que um saco introduzido na água quente dava um ar de café e quando cheguei cá fora meti-o no primeiro caixote do lixo que encontrei.

Eu e 125 Azul

Voltei à minha motoreta. Rodei em velocidade tartaruga na expectativa de encontrar um estabelecimento que vendesse um café decente. De repente mesmo à minha frente um placard, em inglês e tudo, anunciava “ Fresh Coffee”. A proprietária uma senhora de inexcedível simpatia convidou-me a entrar, descalcei os chinelos à porta e bebi ali um café que reputo de bebível.

Por esta altura já terão reparado que o recurso a tanto detalhe, é próprio de quem não tem nada para fazer ou para contar. A não ser que vos fale do manso marulhar das ondas em desmaios sucessivos a meus pés. Talvez devesse também falar das aves canoras tropicais que em voos rasantes povoam o cenário que se me é dado observar.

 
O nosso paraíso para os próximos dias

Talvez pudesse isolar o ruído do motor de um barco desportivo que leva dentro sonhos e turistas em gritinhos histéricos de quem exterioriza medos e alegrias. Talvez pudesse falar-vos de tanta coisa como até de coisa nenhuma, que é o que vou agora fazer, mas prometendo aqui voltar com o verbo olhar na ponta da caneta, partilhando com quem me lê, estes raros momentos em que a palavra “nada” ganha uma dimensão quase total.

Quando chegámos aqui à praia (continuo sem lhe saber o nome!), vista lá de cima, da apertada curva do monte, parecia ir estar por nossa conta. Apesar de já serem dez horas da manhã não se avistava vivalma, o que, mesmo nestas paragens... é um luxo!

A praia onde estiramos os corpos não é uma praia bonita. Como é a única remedeia-se o que remediado está. No entanto posso tentar descrevê-la e, na liberdade que a escrita me confere, retirar do relato aquilo que menos me apraz. A temperatura da água será de uns 28º, logo um belo caldo de açorda. Como está localizada numa enseada a coberto dos ventos dominantes, ainda por cima rodeada de luxuriante e vigorosa vegetação, está-se aqui como no paraíso.

 
 O velho barco que ilustra o texto

No azul turquesa das águas que a baía forma, um velho barco de pesca aí repousa, emprestando à paisagem o mesmo decorativo papel que o rendilhado das chaminés da aldeia da Conceição. É assim uma espécie de cereja no topo do bolo. Toda a enseada é bordejada por árvores de folhagem densa e larga, provocando assim uma exuberante e frondosa sombra, onde nos resguardamos do sol quando este dardeja com mais intensidade. Não sou praista. Aliás, vigora em mim uma certa incongruência, pois não negando a mim esse facto, estou a retirar um incomensurável prazer desta de onde escrevo.

 Lou e Ali - os nossos novos amigos

 Ontem conhecemos mais dois jovens viajantes, Lou e Ali, ambos com 26 anos e naturais de Austin no Texas – USA. Também eles deixaram para trás os seus trabalhos e apostaram em conhecer mundo durante um ano, ou enquanto o dinheiro durar. Nesta parte do mundo, são às carradas os que encontramos nestas circunstâncias. Aliás, das pessoas que conhecemos, nós somos os que têm o menor tempo para viajar.

Assalta-me de novo esta ideia de abalar. De correr mundo. De largar o que tenho por garantido e partir à descoberta do que está para lá de mim, em suma: de dar largas ao que sinto. O espírito cigano que encarnei, voltou a fazer das suas. Volta não volta questiona-me se não quero “ir ao fim do mundo e voltar”, nirvana que buscam todos os que possuem o DNA desse povo de tez escura, escorraçados por condição, nómadas viajantes por opção. Outro dos meus espectros diz num dos seus verso mais inspirados, “ navegar é preciso, viver não é preciso”, chama-se Fernando Pessoa e julgo que sabia que o iria citar desde esta praia distante, da longínqua Tailândia.

Já por cá andamos vai para três semanas. Não tenho saudades. O que quer dizer, que poderia por cá andar mais algum tempo, caso mo fosse permitido. Por outro lado, anima-me o facto de regressarmos no natal. Este é um tempo de regressos. Voltar à minha terra depois de todo este tempo, vai-me fazer gostar ainda mais de a ela retornar.
E do que eu gosto de chegar!

 Já sonho com a noite que repetimos há décadas. É curioso que daqui, deste areal asiático, deste calor do sol que me aquece, me surjam no pensamento as línguas de fogo do meu madeiro do natal. Disse que não tinha saudades? Menti! Afinal tenho e muitas. Tenho-as de um bom copo de vinho tinto à volta da lareira. Tenho-as de estar na companhia dos que mais quero, e que, com certeza mais me querem.
Nós colocamos santos à beira da estrada. Por aqui colocam pequenos templos

Deixando estes pensamentos do entardecer e depois do maior dia de praia de que me lembro, ainda vimos o sol envergonhado esconder-se atrás do mar, lá entre os batelões, petroleiros e outras naves que ao longe definem a linha do horizonte.

Escrito por pulanito @ janeiro 20, 2014   0 comentários

domingo, janeiro 19, 2014

Luang Prabang - Bangkok - Ko Si Chang 18 de Dezembro de 2013

O relógio despertou-nos ainda a noite era senhora de provecta idade. Eram cinco da madrugada. O voo de regresso a Bangkok estava marcado para as 7.40 horas. Logo, e de modo a respeitarmos a norma de estarmos no aeroporto duas horas antes, tínhamos de nos apressar.

Medi a glicemia. 111 pontos... fantástico! Os valores continuam a descer, o que me leva a crer que a minha doença muito terá a ver com a alimentação que faço em Portugal. Aqui tenho comido à base de arroz e massa e em quantidades ditas normais . Vamos ver como me comporto aquando chegar a Portugal. Gostaria em meu próprio benefício de manter estes valores. Julgo que o meu médico também!

O transfer apareceu à hora marcada. Quando pensei que a cidade dormia, esta está mais desperta do que eu. Parte dos estabelecimentos estão já de portas abertas apesar de ainda serem 5.45 horas e ainda ser noite cerrada.
Penso para comigo que esta gente não dorme!

Monges em cerimónia de alimentação matinal

Alimentado monges pela manhã

De repente, saídos de um templo uma mancha laranja de umas dezenas de monges caminha em silêncio e em fila indiana em direção a lugar desconhecido. Alguém me diz dentro da carrinha que vão ser alimentados, ritual que acontece todas as manhãs e por vontades beneméritas de quem se sente agraciado pelas suas preces, pensamentos e presença.

De partida de Luang Prabang

O aeroporto é pequeno. Dizem-me que esta ala onde me encontro é de construção recente, o que leva a pensar, que antes seria pouco mais que um aeródromo. Reencontrámos o Patrick que também viaja para Bangkok e posteriormente para as ilhas mais a sul. No caminho a pé para o avião diz-me que na semana passada uma aeronave desta companhia (Lao Airlines) se despenhou algures na selva, morrendo todos os ocupantes. Não conto à Natália. Não a quero alarmar. Em vez disso recorro à minha lógica. Não me lembro de qualquer companhia aérea a quem dois aviões tivessem caído na mesma semana. Logo, esta, é para mim a linha aérea mais segura do mundo. Lógicas minhas para afastar o medo!

 Como tenho de matar o tempo resolvo escrever. Como estou parco de ideias, “encho chouriços”, escrevinhando acerca de trivialidades que não mereceriam uma linha, caso a ocasião fosse outra.

Por falar em “encher chouriços”. Ontem vi em Luang Prabang uma senhora sentada no passeio que tinha à sua frente um alguidar de uma massa assim a dar para o acastanhado. De seguida vi-a literalmente meter a mão na massa e começar a encher uma tripa. Enchia salsichas em plena rua, de mãos nuas, sem qualquer dos preceitos de higiene a que no ocidente estamos obrigado e desde há muito habituados.

Sentei-me num café por perto a admirar o espetáculo do enchimento das ditas salsichas, coisa que fazia aos colares. Quando tinha um colar composto, atravessava a rua e colocava-as numa armação para o efeito, à esquina, ao sol, e à exposição do fumo das motorizadas e tuc-tucs que passavam no local às gorpelhas.

A razão porque atravessava a rua e as colocava naquele preciso local, não tenho para tal, qualquer explicação lógica. Ainda cheguei a pensar que aquela esquina fosse uma espécie de fumeiro. Já comi salsichas fumadas e gostei bastante. Mas isto sou eu a variar enquanto o sacana do avião não aterra, vai daí que me pus aqui a “encher chouriços”, na verdadeira acepção da palavra. As coisas que o medo nos obriga a fazer!

 Aterrámos finalmente em Bangkok e em absoluta segurança. Dali teríamos de arranjar transporte para o nosso destino desse dia. Uma ilha a 120 km da capital e de seu nome Ko Si Chang. Escolhemos esta ilha, por ser perto de Bangkok, logo não nos obrigando a longas estiradas, que seriam sempre duas, tanto para lá chegar como para regressar. Feitas as contas consumiríamos dois dias de férias apenas em deslocações. Vai daí e apesar do que lemos acerca da ilha para onde nos dirigimos não indiciar um local de grande beleza, resolvemos arriscar.

Tínhamos várias indicações como lá chegar, mas sempre implicando apanhar vários transportes. Vai daí a opção táxi, afigurou-se-nos fazível desde que o preço fosse comportável.

No aeroporto perguntámos pelo preço da corrida. Foi-nos respondido 1.300 baths. Agarrei na calculadora mental e a coisa dava menos de 30 €, ou seja 15 € cada um de nós. Ainda fizemos e refizemos as contas, não se fosse dar o caso de estarmos enganados. Mas não! Era mesmo esse o valor. Metemos as malas no porta bagagens e ala que se faz tarde.

O problema que tivemos no caminho foi comunicar com o pobre do motorista que nos conduzia a Si Racha, onde depois apanharíamos um ferry, e depois... fosse o que deus quisesse!

Como vínhamos do Laos, não tínhamos moeda local. Trocar no aeroporto estava fora de questão, já que cá fora a diferença cambial quase dava para pagar o táxi , caso trocasse por exemplo 400 €. Como apenas troquei 140 € ganhámos 300 baths em relação ao câmbio oficial do aeroporto. Portanto trocar dinheiro no aeroporto, só mesmo em último caso. (aqui fica uma das poucas dicas que arrisco!)

 Tentámos com o pobre do motorista comunicar de forma a pararmos num qualquer banco. Em inglês mesmo a palavra bank era para ele ininteligível. Optámos então pela mímica. Não sei o quê nem o porquê, mas ele só se ria. Supus ser engraçado, mas o resultado continuava igual: negativo! Mostrámos-lhe o dinheiro. Mudámo-lo de uma mão para a outra em sinal de conversão de moeda. Nada! O homem era um autêntico cepo no que diz respeito ao entendimento.

Até que, teve uma excelente ideia. Telefonou a alguém. Provavelmente um amigo, que sabia qualquer coisa de inglês. Passou-me o telefone, expliquei ao amigo do outro lado da linha que por sua vez lhe traduziu o nosso desejo. — Ahh... Benk !!! — exclamava contentíssimo, ao mesmo tempo que com o polegar em riste afirmava finalmente ter entendido o nosso desejo. De vez em quando olhava para trás sorria mostrando os poucos dentes que possuía e dizia. — Benk, benk !!

Ainda pus em causa a sanidade mental do senhor, mas depois reparei que era mesmo assim. E quando assim é, nada melhor do que sorrir também e retorquir com o polegar em riste: — Benk, Benk!! Depois de várias voltas a Si Racha à procura do porto onde se apanhava o ferry, mas sempre na direção oposta ao mar, a Natália ganhou coragem e numa linguagem gestual que nunca lhe vira, assim à laia de polícia sinaleiro ¬ mostrando a palma da mão , virou-se para o motorista e disse — STOP! — E não é que resultou!
A primeira parte estava conseguida. O homem parou o carro. Depois por gestos fez-lhe sinal para que abrisse o vidro da janela do pendura. Nova vitória! O homem percebeu.
De seguida e sem perder a embalagem, sempre com a mímica como linguagem de referência, colocou-lhe a mão à frente dos olhos, fazendo deslocar quatro dedos que chocavam contra o polegar colocado por baixo, como se fosse uma boca a falar.
Novo acesso de lucidez do homem do volante acompanhado da elevação do polegar em sinal de compreensão. O homem finalmente abriu a janela e perguntou em tailandês a direção do porto a uns locais que pareciam ali ter sido plantados exatamente para que isso lhes fosse perguntado.
Afinal, era mesmo ali ao lado. É lógico que se íamos apanhar o ferry, este tinha que ser à beira-mar e não no centro da cidade como o microcéfalo do nosso motorista insistia em fazer. Enfim grotescas situações de quem se mete nelas!

 
De partida para Ko Si Chang

Já estamos a bordo do ferry. Até agora nem um único turista. Apenas gente local. Situação que nos deixava antever que escolhêramos o local errado para terminarmos as nossas férias. O ronfeiro barco lá foi galgando onda atrás de onda até que quarenta minutos passados começámos a avistar a ilha por que optáramos.
 
Com um ar assim para o circunspecto a caminho de K Si Chang

Ao aproximarmo-nos da ilha, apenas vislumbrávamos barcaças às dezenas, mais outras tantas plataformas com gruas, indiciando uma atividade marítimo-industrial nada condizentes com o paraíso esperado. Confirmando de algum modo as suspeitas geradas aquando da entrada no ferry.
O barco lá se abeirou do porto de Ko Si Chang. Saltámos com a nossa bagagem para terra firme tendo de imediato sido abordados pelos nativos acerca das alternativas locais. Como sabíamos que a ilha só tinha uma praia, alugamos um tuc-tuc para ali nos transportar. Este pequena porção de terra rodeada de água por todos os lados, não terá mais de uns cinco quilómetros de extensão e de um lado ao outro da ilha menos de dois.

Aspecto da ilha à chegada

A primeira imagem que vos posso transmitir é de inesperada desolação. Assim à primeira vista, esta é uma terra feia, desordenada e com gente malparecida. Já que aqui estamos, vamos lá desbravar esta Ko Si Chang!

Imagem dos estragos provocados pelo acidente. Guarda lamas, farol e farolim pró maneta

 O nosso motorista conduz-nos por artérias virgens ao nosso olhar. Ao atravessar a aldeia e na tentativa de ultrapassar um veículo cuja lentidão o fazia exasperar, arriscou a transposição da pachorrenta camioneta , só que do outro lado vinha uma carrinha pick-up. Resultado! Um choque semi-frontal, já que o tuc-tuc ficou entalado entre o camião e a carrinha provocando danos quer num, quer noutro veículo. Pela nossa parte, para além do susto a única coisa que pensei, foi : — Pronto temos o balho armado!

 O que me surpreendeu foi o modo como os três condutores resolveram a contenda. Sem descerem dos seus veículos berraram uns com os outros. Gesticularam que se fartaram, mas, apesar dos danos visíveis, nada de polícia, nada de seguros, nada de declarações amigáveis. Apenas fizeram marcha atrás, e logo que arranjaram caminho livre, fizeram-se a ele como se nada tivesse ocorrido. Curiosa esta maneira de se resolverem as disputas de trânsito acompanhadas de acidente. Afinal esta ilha pode ser uma excelente caixa de surpresas, dei comigo a pensar!

O meu olhar vai consumindo o que se me é dado a observar.
Aquela ideia que temos duma ilha tropical perdida nos confins do mundo, com praias intermináveis de finas areias, coqueiros e palmeiras quase debruçados sobre o mar, que em preguiçosas e lentas investidas, faz desmaiar na praia as ondas que dão vida ao cenário imaginado.
Talvez mesmo com uma bebida estupidamente gelada na mão só para compor o ramalhetes, ou mesmo posar para a fotografia.
Estão a ver, não estão? Pois aqui é tudo exatamente ao contrário.
Ao passarmos pela povoação principal, fiquei com aquela sensação que fora transportado para a Cova da Moura ou quiçá para a Pedreira dos Húngaros, mas...com praia!
Lá seguimos a estrada em direção à única praia da ilha. Todas as nossas esperanças estavam aí depositadas. Já não esperávamos uma descrição como a que fiz acima, mas que, pelo menos, tivesse condições mínimas para aqui fazermos os nossos últimos dias de férias.

 
A nossa casinha para os próximos dias

Chegados à praia, o motorista do tuc-tuc, logo chamou uma senhora, para que nos mostrasse os alojamentos disponíveis. Bastou uma breve olhadela para o interior do que se nos era apresentado, para que rejeitássemos taxativamente a oferta que nos era feita. Falo de um quarto ao nível daquele de Pak Beng e por um disparate de 1200 Baths.
Pedimos ao motorista que nos levasse a outros sítios já que aquele não satisfazia minimamente as nossas pretensões. Pelo caminho uma jovem ilhoa, pede boleia ao motorista.
Ao saber-nos à procura de alojamento logo nos aconselhou uns bungallows um pouco longe da praia, mas com a vantagem de o alojamento ter duas chaves. Uma para a porta de casa, outra de uma scooter que fazia parte do pacote.
Conseguimos este alojamento com moto incluída por 800 baths diários. Pareceu-nos um excelente negócio, até porque as comodidades oferecidas eram, para o nível a que estávamos habituados, excelentes.

 Ko Si Chang - vamos lá descobrir-te!

Por ali fizemos poiso. O dia era de calor, como de resto todos os que aí passámos. Daí decidimos ir a uma loja de conveniência comprar umas cervejas, até porque queríamos dar uso ao frigorifico instalado na nossa casinha.

 Entre outras coisas adquirimos duas garrafas de Chang. Ao chegarmos à caixa a simpática funcionária diz-nos, não podermos adquirir as cervejas, pois álcool , só se vende entre as 11 e as 14 horas e depois das 17. Não tinha como não aceitar a imposição, ao que julgo, legislativa, mas há quase três semanas que andamos por aqui e é a primeira vez que dela ouvimos falar . Por outro lado, se eu quiser beber uma cerveja, esta, está à venda em todo o lado e a toda a hora e, inclusive, as cervejas que pretendia adquirir nem sequer eram para beber de seguida. Eram para termos no frigorifico para quando as quiséssemos beber, no terraço da casa, que me pareceu ter sido concebido para que alguém desfrutasse de uma cerveja gelada enquanto saboreia o sereno da noite. Como em Roma se deve ser Romano, lá deixámos as cervejas por mais ou menos vinte minutos, já que era o tempo que faltava para as cinco da tarde.


Nesse nosso primeiro dia em Ko Si Chang, pouco mais fizemos. Demos umas voltas de motoreta, jantámos numa espécie de restaurante, onde voltei a comer arroz frito, prato onde me refúgio face ao meu pouco aventureirismo no que à gastronomia local diz respeito.

Escrito por pulanito @ janeiro 19, 2014   0 comentários

sábado, janeiro 18, 2014

Laos - Luang Prabang 17 de Dezembro de 2013

Hoje apesar do frio que ainda impera, o sol dardeja em raios calorosos temperando o dia que se avizinha. Alugámos uma scooter e vamos dar umas voltas por aí. Recomendaram-nos que visitássemos as cascatas de To Kuang Si, situadas a 32 Km do centro da cidade.

Oh pra nós viajando nas asas do vento na nossa scooter

Percorremos as estradas deste país, deixando-nos embalar nas asas do vento que sopra com alguma intensidade. Sentimo-lo na cara despertando-nos os sentidos para a vida que exulta à beira-estrada.

Entrada do parque

 Ali chegados, somos surpreendidos pelo aparecimento de um outro companheiro de viagem. Este chama-se Jurgen, Holandês, tem 40 anos e curiosamente tal como o Jaime também é polícia e... também viaja sozinho. É singular a afinidade que de repente se cria entre viajantes. Apenas víramos o Jurgen no slow boat até Pak Beng, mas logo ali surgiu uma interação que estou seguro noutro lado dificilmente aconteceria. Resultado: andámos juntos todo o dia.

 
Os simpáticos ursos asiáticos

Logo à entrada do bem cuidado parque, um santuário de ursos asiáticos. Uns simpáticos animais, todos negros e com uma lista branca em V, que parecem todos ter um pulôver vestido. No caminho que nos conduz à real atração do dia, já ouvimos ao longe o despenhar das águas no lago por elas formado. Olhando à minha volta fico com a nítida sensação de que o Grande Arquiteto estava em dia de rara inspiração quando moldou esta pedacinho do planeta.

 As tais piscinas de água cristalina com a Natália a embelezar a foto
 
 Provavelemente a nossa melhor foto de férias..daí ser republicada várias vezes, só que desta, vem a propósito do texto.

De uma altura que não consigo imaginar precipita-se um invulgar caudal de água que no percurso até onde os nossos olhos abrangem, vai formando em socalcos um sem número de piscinas de águas cristalinas, onde, caso o tempo o permita, nos podemos banhar a nosso belo prazer. Não é o caso do presente dia.

Aqui vamos nós!

Depois desta merecida visita, regressámos à estrada. De novo montados na nossa máquina e com a Natália à pendura, continuo a sentir os gritinhos nervosos de quem não tem ainda total confiança em quem leva nas mão o volante. No caso presente eu!

O nosso almoço desse dia

Como dispúnhamos de tempo, e na companhia do Jurgen, demandámos um outro local, onde se nos prometiam, mais quedas de água, bem como, uma aldeia de preservação de elefantes, onde se podia interagir com os simpáticos paquidermes. Devido ao avançado da hora quando aí chegámos, já não nos foi possível fazer a visita, mas mesmo assim foi um belo passeio motorizado por estradas de terra batida e de frondosa vegetação nesta terra a merecer nova visita, agora que foram dissipadas todas a dúvidas em relação à hospitalidade destas gentes.


 
 
 Despedida em forma de pôr-do-sol do nosso amigo Jurgen e do Rio Megong

Regressámos ao entardecer a Luang Prabang, ainda a tempo duma derradeira Beerlaos ao pôr-do-sol sobre as águas do Megonk. Um espetáculo a reter na memória, nem que seja através das múltiplas fotos aí tiradas.

Despedimo-nos do Jurgen, regressando à nossa casa de hóspedes, para a última noite por estas paragens.
Amanhã, estaremos de regresso a Bangkok!

Escrito por pulanito @ janeiro 18, 2014   0 comentários

sexta-feira, janeiro 17, 2014

Laos - Luang Prabang 16 de Dezembro de 2013


Hoje é dia de explorar cantos e recantos desta cidade Património da Humanidade segundo os padrões da Unesco. Surpreende-me o número de guest houses no centro histórico. Diria que há ruas inteiras onde apenas encontramos casas de hóspedes desta natureza. Das que visitámos, achei que eram melhores que as da Tailândia e aquela que escolhemos para estes três dias é uma gracinha. Toda em madeira, dividida em dois pisos. É assim como um chalet de montanha, mas num país tropical.

 Notas para memória futura duma viagem inesquecível

Ao embrenharmo-nos na cidade através das suas múltiplas ruas e ruelas, vamos dar ao casco antigo. Aqui predominam os monges e inevitavelmente a vida monástica, com os seus templos, escolas, oficinas e alojamento para estes seres que escolheram como modo de vida, a incessante busca da pureza através da meditação.

Se na Ásia as pessoas, ruas e cidades são ruidosas, estes espaço de onde escrevo, são oásis de silêncio e contemplação. Sinto-me bem aqui! Na verdade até parece que me esqueci de quem sou. Absorvo de cada momento aquilo que este tem para me dar. Tenho uma espécie de esponja no olhar.

Regressámos ao mercado para começar o dia. Em cada dia um novo espetáculo de cor e de surpresa. Os produtos são comercializados segundo as regras locais, o que, para muitos ocidentais pode parecer chocante segundo os nossos castradores padrões.

 Come-se em todo lado e a toda a hora, neste caso no mercado noturno

Esta gente come o dia inteiro. Comem na rua, na loja, no escritório enquanto atendem clientes, tudo na maior das naturalidades. Há que ter em consideração que horário de trabalho é coisa que por aqui ninguém ainda ouviu falar. Laboram consecutivamente 14 ou 16 horas por dia, 7 dias por semana, 365 dias por ano e sempre de sorriso no rosto. Segundo os meus padrões ocidentais....é obra!!

São 12.30 horas, parámos para almoçar numa zona calma da cidade.
Numa esquina que vendia sopas decidimos parar para almoçar. Cheiram bem as sopas que as duas orientais, nossas companheiras de mesa comem.
Quando as nossas chegaram, procurei imitar as raparigas locais, e introduzi na sopa aquilo que lhes vira juntar, mas em proporções que denunciavam precauções pela minha parte, não fosse o diabo tecê-las!
Como a fome era substancial, meti logo uma colherada à boca.
Quando as papilas gustativas detetaram os paladares gerou-se dentro de mim um invulgar turbilhão, entrando de imediato em alerta vermelho. A minha boca deixou de o ser. Passou a ser o Vesúvio em dia de erupção, tal era o fogo que me invadia e que subia das entranhas até aos lábios que por esta altura já deixara de sentir. Olhei para quem estava ao meu redor. Tudo normal. Só que os meus olhos insistiam em sair das órbitas. Fiquei mesmo com receio de um deles, ou quiçá os dois, me caírem na sopa.
A Natália vendo-me no olhar o pavor que me assistia, resolveu provar com cuidado a minha sopa.
— Fónix!— Exclamou ao mesmo tempo que bebia de um só golpe o copo de água à sua frente.
A nossa companhia ocasional, não foi capaz de conter o riso e desmancharam-se de gozo ao ver a aflição estampada nos nossos rostos.

Já depois do Etna me ter passado pela boca

Depois da experiência gastronómica relatada, passamos parte da tarde a deambular pelos recantos mais recônditos desta cidade milenar. Ao entardecer regressámos ao centro histórico onde decorria o mercado noturno e onde fizemos algumas compras natalícias.

 Mercado noturno de Luang Prabang
 
As famosas gargantilhas de prata que eram (ou será que ainda são?) dotes de casamento.

 Uma recordação gratuita - o sorriso genuino desta senhora

Esta feira desenvolve-se ao longo da rua principal, mesmo em frente ao principal templo e museu da cidade, tendo a particularidade de se realizar todos os dias do ano, quer chova ou faça sol. O artesanato da região é, como já disse, raro, fora do comum, bem feito e barato, daí os turistas de passagem por esta cidade confluírem para este espaço em busca da lembrança desejada.

Sempre os monges a povoar a paisagem

Num momento em regressámos à casa de hóspedes para depositar as mercas e descansar uns minutos, começamos a ouvir o som grave e seco de um gongo que invadia a cidade. Logo outro de outra tonalidade sonora mais distante se lhe seguiu, lá dos confins ainda outros se lhe juntaram, deixando no ar uma certa sonoridade bíblica, solene, a anunciar algo de importante que estaria para acontecer. A Natália precipitou-se para a rua, disposta a esclarecer o mistério dos gongos. Eu, preferi ficar ali, em silêncio, experimentando a sensação de quem está em todo o lado e em lado nenhum, no lugar certo e à hora certa.

O segredo da sonoridade bíblica

Quando regressou, a Natália trazia a explicação para tão cadenciada sinfonia de gongos. Hoje é noite de lua cheia, coincidente ainda com outros azimutes não decifrados no calendário das coisas da alma. Quando se conjugam todos estes elementos, todos os monges noviços têm de rapar do corpo todos os pêlos, mesmo os das sobrancelhas.

Lá pelas quatro da manhã, em plena calada da noite, voltaram a ressoar os gongos. Não tantos como à tarde nem por um período tão prolongado, mas mesmo assim uma toada envolvente dando a pressentir que algo estava a acontecer.
Voltei-me para a Natália e readormeci no calor do corpo dela e no zoar dos gongos dos monges de Luang Prabang que povoavam esse território chamado; distância!
Bem que a vida podia ser sempre assim! — Dou comigo a pensar antes de me render aos braços de Morfeu.

Escrito por pulanito @ janeiro 17, 2014   0 comentários

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